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Graffiti \Graf*fi"ti\, s.m.
desenhos ou palavras feitos
em locais públicos. 
Aqui eles têm a intenção de 
provocar papos sobre TI e afins.

O Graffiti mudou!

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Eu não sabia, mas a dupla "Arquiteto e Engenheiro" está junta até na festa. Na última terça, dia 11/dez, foi o Dia do Arquiteto e também o Dia do Engenheiro. Não creio que seja coincidência, mas também não corri atrás para descobrir. Não importa. Coincidência é que depois de amanhã (sab, 15/dez), um dos maiores arquitetos do mundo esteja celebrando 100 anos de idade. E eis que todo mundo abre generosos espaços para contar um pouquinho da vida e da obra de Oscar Niemeyer.

O caderno "Mais", da Folha do último domingo, trouxe curiosas leituras das "revoluções" de Niemeyer. Prós e contras!? Como toda unaminidade é beócia, adorei saber que existem "contras". Rica também está uma série de reportagens especiais do Jornal da Globo [1]. O capítulo de ontem foi especialmente chamativo: Engenheiros passavam noites em claro, atrás de soluções para os "problemas" criados por Niemeyer. A palavra "problema" com certeza não apareceu. Mas foi assim que li: o Arquiteto é um "criador de problemas".


Foto de Cristiane Souza (CC - Flickr).


E o que esse papo tem a ver com o Graffiti? Tudo. Não é de hoje que brigo muito para que TI "copie" mais outras áreas de conhecimento. Que aprenda com outras áreas. Há tempos, independente do trabalho, insisto (particularmente lá no finito) que tiremos das costas dos coordenadores de projetos uma parte do peso que eles carregam. Considerando sua formação básica, formalizada pelo PMBoK, sugiro que a disciplina "Gerenciamento do Escopo" vá para outra pessoa: para um Arquiteto.

Não estou sendo nada original não. Lá no distante 1975, Fred Brooks já dizia [2]:

Pensadores são raros. Executores são raros. Pensadores-executores são raríssimos.


Já defendia a tese quando conheci a proposta Scrum, um processo para gerenciamento de projetos. Tem algo muito parecido ali. Há um Product Owner - dono do produto, um Arquiteto (na minha leitura), e um ScrumMaster - o gerente do projeto. O primeiro é o pensador. O segundo, o executor. Jeff Sutherland, um dos "inventores" do Scrum, tem uma didática analogia: como numa equipe de Rally, o primeiro é o "Navegador" e o ScrumMaster é o "Piloto".

A mesma lógica ganha implementações diferentes, provocativas e promissoras. Não me lembro onde vi, mas a Promon tem desafiado alguns dogmas com coragem. Seus departamentos agora têm dois responsáveis. Um cuida do dia-a-dia, enquanto o outro "pensa a longo prazo". Sei, é um tanto diferente do que foi proposto no parágrafo anterior. Mas também serve para ilustrar a "tese".

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Comecei a entender a validade dessa "lógica" antes de conhecer qualquer teoria. Foi na prática, na necessidade, lá no início da década. Trabalhando na linha de frente, quase sempre eu levava para a empresa o problema já acompanhado de uma "idéia de solução". Um mix de requisitos do freguês com idéias que eu não conseguia segurar. Foi doloroso o aprendizado. Eu "carregava" demais em minhas próprias idéias. Aprendi que é um método muito eficaz de diferenciação. Mas, na dose errada, cria problemas. Corrigindo: cria mais problemas do que deveria. Porque, como eu disse lá no início, o arquiteto é (ou deveria ser) um "criador de problemas".

Depois, em outras funções, pude aprofundar um pouco mais as minhas experiências. Repito em minhas palestras e oficinas uma estranha dica: "Tenha um Arquiteto pessimista e um Engenheiro otimista". Combinação fantástica [3].

O Arquiteto pessimista é mais pé no chão. Domina bem a tecnologia em questão e compartilha com o freguês as suas "dores". Mas não viaja. É pragmático e ágil no desenho das soluções possíveis. Quando avaliando todas as possibilidades, em conjunto com a equipe, sempre fala "não" antes do "sim". Aqueles "nãos" que eram pura teimosia costumam morrer em 24 horas. E se converter em criativos e valiosos "sims". Repare: o desenho da solução acontece em grupo. O arquiteto guia o processo. E seu voto é mais valioso que os demais. A razão é simples: ele, por princípio, é o único com a visão do todo.

O Engenheiro otimista não é menos pé no chão que o arquiteto. A diferença fundamental é que ele não é tão negativo. Por natureza, ele não coloca barreiras. Entende que sua principal função é exatamente o oposto disso: eliminar barreiras. Ele trabalha com o time e para o time. Ou seja, é muito distante daquela figura clássica de "gerente". A hierarquia é mero detalhe. Sua liderança brota da experiência e do relacionamento que mantém com todos os envolvidos. Um otimista costuma se relacionar melhor. E suas "brigas" são sempre mais sutis, elegantes. Afinal, todos entendem e compartilham os mesmos objetivos. O engenheiro nunca esquece seus objetivos.

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Como nos ensina Domenico de Masi [4], "criatividade é a síntese de fantasia e concretude". Ou seja, não basta gerar brilhantes idéias. É preciso ter a capacidade de realizá-las. Um grande mito [5] que assombra inovação e criatividade é aquele do gênio, do inventor solitário. Brasília não existiria se não fossem os esforçados engenheiros que conseguiram transformar as fantasias de Niemeyer em concretude - em realidade.

Equipes de projetos são obrigatoriamente equipes criativas. Por definição elas estão criando. Quando compostas por pensadores e executores que se complementam, suas chances de sucesso aumentam bastante.

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Notas:
  1. Já reparam que todo conteúdo de melhor qualidade a Globo esconde nas madrugadas? Pq cargas d'água a série não entrou no Jornal Nacional? Seria demais para os Hommers, Mr Bonner? Santa Infelicidade.
  2. "The Mythical Man-Month". Outro conteúdo dos bons que fica "escondido" da gente. Clássico com quase 33 anos de idade, nunca mereceu uma edição em PT-BR. Pode?
  3. Nelson Ponce e Luis Felipe Braga foram as cobaias mais frequentes dessa experiência. Trocando chapéus, conhecimentos e algumas palavras de baixo calão - entre eles ou comigo no meio. Não importa. Como eu disse, foi uma combinação fantástica.
  4. "Criatividade e Grupos Criativos". Publicado originalmente pela Sextante com quase 800 páginas. Depois, tentando popularizar o título, a editora dividiu-o em duas partes. Para Hommers, Beócios ou preguiçosos?
  5. "Os Mitos da Inovação", de Scott Berkun, está saindo em PT-BR?!? Por isso não pára de chover. Mas seu primeiro título (que está mudando de título?!?), ainda é inédito por aqui. Chamava-se "The Art of Project Management". Não importa. Leia o novo e pegue um tira-gosto do antigo aqui.

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